terça-feira, janeiro 20, 2009

ENQUANTO UNS PENSAM NO CARNAVAL,OUTROS PENSAM NA VIDA!

Moradores de encostas temem início da temporada de chuvas
Eder Luís Santana, do A TARDE On Line
Luciano da Matta / Agência A TARDE

Encosta é ameaça à casa de Iraci Sodré

O medo é maior durante a madrugada, quando o sono é interrompido pela chuva. Ao levantar da cama, o chão costuma estar molhado e as paredes rachadas se afastam umas das outras até que tudo desce pela encosta. Essa realidade a comerciante Iraci Sodré, de 41 anos, já viveu três vezes. Moradora do subúrbio, ela é uma dos milhares de soteropolitanos que vivem em áreas com risco de desabamento e que voltarão a ser locais de perigo daqui a menos de três meses, com o início do período chuvoso em Salvador.

É entre abril e junho que os índices pluviométricos começam a subir e pessoas como Iraci têm mais chances de se tornar vítimas dos deslizamentos de terra e alagamentos. De acordo com dados da Defesa Civil (Codesal), a capital baiana possui 533 áreas de risco. Representantes da prefeitura admitem que a administração municipal não tem recursos próprios para fazer a contenção de todas as encostas. Cada obra desse tipo custa de R$ 300 mil a R$ 1 milhão, a depender do tipo de serviço realizado.

A solução apontada são as verbas do governo federal. Em dezembro, o Ministério da Integração enviou pouco mais de R$ 4 milhões para o trabalho de contenção em 11 encostas. De acordo com o diretor de obras da Superintendência de Conservação e Obras Públicas do Salvador (Sucop), Ricardo Chilazi, sete empresas terceirizadas foram contratadas para finalizar os serviços de contenção desses locais até março.

“Foram escolhidos os pontos mais críticos para essas obras”, explica Chilazi, após lembrar que existem 40 projetos de contenção de encostas nos arquivos da Sucop. Pelo menos 22 deles têm a verba garantida (R$ 10 milhões) pelo ministério, mas a liberação do dinheiro só deve ocorrer depois de começada a temporada de chuvas. “Depois que tivermos todas as 40 encostas contidas, planejamos contratar uma empresa para formular projetos de melhoria em outras 100 encostas de Salvador”, promete.

OCUPAÇÃO – Para Chilazi, o grande problema é que os moradores insistem em ficar nas áreas de risco. Pessoas como Iraci, que mora na Rua do Curió, em Mirante de Periperi. Na frente de sua casa existe uma encosta sendo contida por funcionários da prefeitura. No entanto, no fundo do imóvel existe outra ainda mais perigosa e por onde sua residência já desceu três vezes.
A última tragédia na vida de Iraci aconteceu em 2007. Depois de oito dias de chuva, acordou de madrugada com seu gato de estimação aos pulos em cima da cama. Ao levantar, sentiu o chão úmido e as paredes se afastando pouco a pouco. “O terreno desceu todo”, lembra Iraci. Por sorte, nenhum morador saiu ferido, mas as marcas psicológicas do acidente perduram até hoje com o temor constante ao ver nuvens cinzas no céu.

Depois de morar de aluguel por alguns meses – a prefeitura chegou a ajudar com R$ 100 de auxílio-aluguel –, Iraci reergueu sua casa com a ajuda de parentes e amigo. Sem ter para onde ir, ainda montou um bar dentro de casa, onde vende bebidas e salgados para os moradores da região. “Não tenho renda fixa. Ficar aqui é a única solução”, completa.

OBRAS – O superintendente da Sucop, Luciano Valladares, lembra que, além da contenção das encostas, a Operação Chuva inclui a limpeza de canais para evitar transbordamento. Porém, admite que o poder público não consegue realizar obras na mesma velocidade em que as ocupações desordenadas tomam conta da cidade.

“Parece uma briga de gato e rato. Nós fazemos a limpeza do canal e temos de voltar todo ano, pois a população volta a jogar resíduos sólidos no lugar. E pior, ocupam toda a área e impedem que os trabalhos aconteçam“, assinala.

Valladares lamenta ainda que o mesmo aconteça com as construções irregulares. Novas áreas de risco surgem a cada dia com casas sendo erguidas sem nenhum suporte de engenharia em terrenos inadequados. “Seria preciso uma nova política de habitação do governo para resolver esse problema. A cidade cresceu de modo desordenado“, pontua.

Foi o que aconteceu na Travessa Jussara, em São Tomé de Paripe. Por lá a prefeitura está fazendo a contenção da encosta nas ruas Costa e Silva e Alto da Igreja. Ainda assim, a região toda ocupada por invasão tem risco de grave acidente na travessa que fica nos fundos de um cemitério. “Algumas famílias abandonaram suas casas com medo da terra voltar a descer. Até ossos do cemitério já foram vistos no meio da lama que escorre em dias de chuva”, relatou a moradora Hildete Araújo, de 44 anos.

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